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domingo, 12 de fevereiro de 2012

fábulas ecológicas modernas

Fábulas Ecológicas Modernas
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB)

Da viola do urubu
sapo caiu no penhasco,
gritando: “Arreda, lajedo,
sai, pedra, senão te lasco!”
(Marcus Accioly. Da festança-no-céu. In: Guriatã: um cordel para menino)

A palavra fábula tem origem latina e aparece em outras línguas sempre com o mesmo sentido – conta uma história tendo como protagonistas animais. Quanto à origem, remonta a tempos muito antigos. Embora se fale nas fábulas de Esopo (Grécia, VI a.C.,) Fedro (Roma, século I), La Fontaine (França, século XVII), o Oriente é considerado o berço deste gênero literário.
Câmara Cascudo, em “Literatura oral do Brasil” (1984:87), afirma que as histórias de animais, as fábulas clássicas, são milenárias. Os europeus representavam os temperamentos humanos sob a forma de animais. Para africanos e ameríndios, os animais viviam essa própria ação anímica e eram dotados de todos os poderes e raciocínios dos humanos. Possuíam o segredo do fogo, do sono e de certos vegetais.
Nas primeiras décadas do século XX (1920/1930), Monteiro Lobato procurou retirar o ranço moralista que envolvia as fábulas e deu-lhes nova roupagem ao escrever as “Fábulas de Narizinho” (1921).
Em carta ao amigo Godofredo Rangel (8 de setembro de 1916), Lobato expõe o esboço de um projeto: “Ando com várias ideias. Uma: vestir à nacional as velhas fábulas de Esopo e La Fontaine, tudo em prosa e mexendo nas moralidades”.
Na história da literatura as fábulas sempre retornam, modernamente aparecem destituídas das antigas moralidades e apresentam novas maneiras de ver o mundo, conservando, porém, a presença de animais falantes e que agem como os seres humanos.
É dentro desta nova linha de fábulas que o escritor paraibano, radicado em Recife, o médico psiquiatra Luiz Carlos Albuquerque, escreveu duas histórias – “As aventuras de Urubill” e “Batra, o sapo”, livros publicados pela Editora Bagaço, Recife, 2011. Além de escrever para crianças, contos e cordel, Luiz Carlos Albuquerque é autor de um ensaio sobre Augusto dos Anjos – “Eu, singularíssima pessoa”, livro que foi consultado pelas pesquisadoras do projeto “Redescobrindo as Trilhas de Augusto dos Anjos” para escrever a “Biobibliografia de Augusto dos Anjos” (Ed. Universitária, UFPB, 2008) e “Augusto dos Anjos em imagens: uma fotobiografia” (Ed. Ideia, 2010).
Mas vamos em busca das fábulas fabulosas criadas por Luiz Carlos Albuquerque.
Urubill é o protagonista do livro “As aventuras de Urubill” e habita a região do açude Prata, no bairro de Apipucos, em Recife, é um urubu caminhante, gosta de dar longos passeios e voos rasantes pelas margens do rio Capibaribe. O interessante desta fábula é a amizade que surge entre o Urubill e a garça Graça. Esta ensina o amigo a comer peixe. Urubill abandona os antigos hábitos alimentares e passa a comer peixes e vegetais.
Dentre os amigos de Urubill, destacam-se Sombra, Gardel e Flatista Sombra era um urubu com ares de poeta, ficava pousado em uma jaqueira “lendo poemas de um tal de Augusto dos Anjos, repetindo várias vezes o trecho predileto deste poema: “Ah! Um urubu pousou na minha sorte!”
Batra é um sapo e o personagem principal de “Batra, o sapo”. Andarilho por natureza, gostava de fazer caminhadas noturnas pelas ruas do Recife na companhia do jovem poeta Austro Costa, isso lá pelos anos de 30 e 40 do século XX. Morava na curva do rio Capibaribe, perto do Palácio das Princesas. Era muito, muito velho, dizia que conhecera pessoalmente o Conde Maurício de Nassau e Tabira, o chefe tabajara.
Tinha o hábito de reunir os sapos menores e os adultos e lá vinham histórias do Recife antigo relembradas por Gilberto Freyre no livro “Guia Prático, Histórico e Sentimental do Recife”, com 1ª edição em 1934 e reeditado diversas vezes. Dizia o Mestre de Apipucos:
“Os maus urbanistas quiseram aterrar primeiro o Beberibe, depois o Capibaribe para sobre esses ex-rios edificarem casas, apartamentos e vilas disto ou daquilo”.
Os rios não morreram de sede, mas tiveram, com o desenvolvimento da cidade, seus cursos alterados, sofreram mutilações, aterraram seus mangues, construíram edifícios, shopping center, abriram-se avenidas e os rios do Recife foram perdendo o encanto e a magia dos versos decantados pelo poeta Austro Costa:
“Rio Capibaribe
Capibaribe meu rio,
espelho do meu sonho”.

Temos muito o que aprender com as fábulas, com os animais, com os rios. Luiz Carlos Albuquerque, com essas duas fábulas modernas, ensina-nos a conviver pacificamente com a natureza, a não poluir os rios e a respeitar o meio ambiente.

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